Terra de flores inventadas

“Você foi viajar porque sentiu o chamado deste movimento, não foi? Viva isso!”

Assim cantou a sábia sabiá ao ouvir a insatisfação da passarinha – lições amargas embaladas em doces melodias parecem doer menos.

Vista da Serra de Collserola, a Catedral Sagrada Família se destaca no panorama
Padrão de estampa das calçadas

Em Barcelona, chegou cabisbaixa, pois as rotas que havia desenhado na mente não fluíam com harmonia – como é difícil aceitar quando a vida não é do jeito que idealizamos! Em algum momento criamos a ilusão de que a autoria da vida é nossa e com a mente bloqueada, resistimos enxergar os caminhos que estão a se apresentar… 

A proximidade do fim do ano foi o gatilho para baixar a energia da passarinha, os últimos tempos foram desafiadores e seu coração sente saudades…

Padrão de estampa das calçadas

Conhecendo este padrão e sabendo a importância de manter rotinas para ofertar estabilidade à mente

neste momento

de intenso movimento,

de manhã fez seus rituais e entregou as dúvidas ao céu – daí no fim da tarde a resposta chegou através de uma auspiciosa conexão feita por um querido pinguim, irmão que esta vida lhe deu e cujas aventuras dariam uma biblioteca inteira!

A vida é uma roda que gira sem parar…

Em um dia estava sem rumo e no outro iria passar o Natal em Paris. 

Com o próximo passo relativamente traçado, se entregou a viver Barcelona. 

El Pont del Bisbe, o point mais fotografado do Bairro Gótico
Parc de la Ciutadella

Bem localizada na costa nordeste da Península Ibérica, se espalha numa estreita faixa plana entre o Mediterrâneo e a Serra de Collserola. Capital da Comunidade Autônoma da Catalunha, tem uma história de ocupação muito antiga, como a maioria das grandes cidades do continente… alguns vestígios de assentamentos humanos datam de mais de 4.000 anos. 

Desde sua fundação, concentra muita riqueza e tem papel importante como centro comercial, mas alcançou status de celebridade após se tornar ícone da arquitetura modernista no início do século XX e especialmente depois das Olimpíadas de 1992. Com ruas que ostentam as etiquetas de design mais famosas do mundo, é a cidade mais visitada da Espanha. O fluxo em parte é para ver as curvas que o arquiteto Antoni Gaudí espalhou em diversos edifícios e em parte pela energia vibrante das ruelas medievais do Bairro Gótico, que na hora da siesta parecem abandonadas, mas à medida que a noite chega, se enchem de fiesta com bares e restaurantes.

Recinte Modernista de San Pau
Recinte Modernista de San Pau nas ruas
Jardim Botânico Histórico
Museu Nacional de Arte da Catalunha

A passarinha se aninhou aos pés da Serra de Collserola a fim de seguir num vôo lento, ficar perto da Natureza, circular pelas ruas onde vivem as pessoas que realmente fazem a cidade para vivenciar uma Barcelona além das fachadas urbanas e humanas que dominam o centro. Foi uma ótima decisão. A abundância de turistas consome avidamente, parecem querer sugar a alma ousada da cidade para talvez se tornarem um pouco ela… No verão, se tornam multidões e chega a incomodar os moradores a ponto de existirem campanhas para reduzir o turismo. A fama é uma miragem que cobra caro e deixa a paisagem daquele jeito “para inglês ver”, ou melhor, instagramável.

Catedral Sagrada Família e os “mercadores do templo’’
Catedral Sagrada Família e as “influencers

Ampla mas sufocante.

Luminosa e sombria.

Velha de alma jovem.

Uns adoram, outros nem tanto.

Voa entre construções que parecem joias vivas, por becos escuros que desembocam em edifícios arrojados, uma beleza formas tão distintas terem a mesma funcionalidade urbana. 

Coisas de Barcelona.

Casa Batlló, uma das obras mais famosas de Gaudí, de 1904

Nas vitrines do adorado design catalão, enfeites imitam flores, roupas imitam peles, cerâmicas imitam madeira 

arte imita a natureza

recriando-a a seu bel prazer e necessidade.

Já reparou que o bicho humano destrói a Natureza e depois a recria artificialmente para usar como adorno?

Na ignorância de não enxergar a verdade de Ser Natureza, mas julgando-se superior a ela, admira-a mas trata como um recurso a seu dispor,

se vê como algo diferente,

se separa

e daí nasce a desarmonia.

Aquela insatisfação que insiste mesmo quando tudo parece estar certo na vida, um desconforto na própria pele…

Um aperto que um dia vai bater na porta do seu coração e que você vai buscar em alguma loja algo que solucione…

Mas a resposta está dentro de você.

Já pensou sobre isso?

Diz o mestre:

A separação é ausência de Amor.

Amor é a ausência de separação.